quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Diferença entre mito e filosofia, segundo Marilena Chaui

“Confrontando-se as narrativas míticas e a filosofia dos pré-socráticos, há uma série de diferenças que é preciso salientar. Em primeiro lugar, enquanto os mitos buscavam narrar como as coisas teriam acontecido em uma época longínqua e imemorial, muito antes do tempo presente, os filósofos se incumbiram da tarefa de explicar as características da realidade de qualquer tempo, seja ele passado, presente ou futuro. Em segundo lugar, é próprio dos mitos falar sobre a origem de todas as coisas referindo-se a genealogias divinas, ou então a rivalidades e alianças entre os deuses. Como vimos, os mitos explicam a origem das estações do ano por meio de um incidente envolvendo os deuses Hades, Deméter e Perséfone, da mesma forma que atribuem o surgimento dos males terrenos à rivalidade entre Zeus e Prometeu. A filosofia, por outro lado, evita recorrer a causas sobrenaturais, esforçando-se por encontrar na própria natureza as causas do surgimento dos seres e de suas transformações. E, em terceiro lugar, se as narrativas míticas não estavam livres de contradições, e caracterizavam-se pelo seu conteúdo fabuloso e muitas vezes incompreensível, os filósofos, por sua vez, não aceitam contradições em suas ideias, nem se utilizam de explicações fabulosas ou misteriosas. Ao contrário dos mitos, que têm sua autoridade baseada na pessoa que o narra – geralmente alguém a quem se atribui uma revelação divina –, a filosofia fundamenta sua autoridade na razão comum a todos os seres humanos, e por isso constitui um discurso coerente, lógico e racional.”




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